domingo, 25 de novembro de 2012

Cinco cidades maranhenses estão entre as mais vulneráveis ao tráfico de pessoas



*de O Estado do Maranhão

O tráfico humano para fins de exploração sexual é a terceira maior fonte de renda ilegal do mundo, atrás apenas do tráfico de drogas e de armas. O tema, trama principal da novela Salve Jorge, da TV Globo, é realidade para muitas maranhenses e desafia as autoridades. A titular da Secretaria de Estado da Mulher (Semu), Catharina Bacelar, concedeu entrevista, na manhã de sexta-feira, ao programa Ponto Final, da rádio Mirante AM, onde falou sobre a campanha 16 Dias de Ativismo, pelo fim da violência contra as mulheres, que tem início hoje em São Luís, e o estabelecimento da Ouvidoria da Mulher do Maranhão.


Segundo a secretária, dos 94 municípios do país com maior registro de tráfico de pessoas, cinco estão no Maranhão. Na televisão, Jéssica, a personagem de Carolina Dieckmann, sai do Brasil para ser modelo, mas na verdade cai na armadilha de grupo de traficantes internacionais e vai parar em uma boate usada como prostíbulo. Em seguida, será a vez de a protagonista da trama, Morena, vivida por Nanda Costa, ser enganada pela quadrilha. É contra histórias semelhantes a essas contadas na ficção que instituições se unem em combate.

Catharina Bacelar também aproveitou a ocasião para falar sobre a as agressões e assassinatos cruéis de mulheres ocorridos no estado, vítimas de marido, amantes e ex-namorados. Nas duas últimas semanas, pelo menos dois casos chamaram a atenção do público. No dia 18, a dona de casa Roseane dos Santos, de 21 anos, foi assassinada com 24 facadas, durante a madrugada, em Bacabal. O crime, segundo a Polícia Civil do município, foi praticado pelo próprio companheiro, o lavrador Elias da Conceição. No dia 14, em Mirinzal, a população matou a pauladas e facadas Nilton Pinheiro Cardoso, de 40 anos, que havia fugido após assassinar a ex-mulher e ferir a sogra por não aceitar o fim do casamento.

O Estado - Para que fins as mulheres do Maranhão são traficadas?

Catharina Bacelar - O tráfico de pessoas se dá em três frentes: o trabalho escravo, a exploração sexual e o comércio de órgãos. É o terceiro negócio que mais movimenta recursos, só perdendo para o tráfico de drogas e de armas. Pesquisas apontam que o tráfico de pessoas já teria assumido a segunda posição. São US$ 70 bilhões por ano. Não há registros de comércio de órgãos na Secretaria, mas a Organização das Nações Unidas (ONU) já admite que de 5% a 10% de todos os transplantes de rins que ocorrem no mundo são feitos com órgãos traficados.

O Estado - Quem são as principais vítimas do tráfico para exploração sexual?

Catharina Bacelar - Mulheres e crianças formam a maioria das vítimas, principalmente no tráfico interestadual. O tráfico para a exploração sexual internacional parece ser algo distante da realidade maranhense, mas está muito presente. Há registro de tráfico de muitas meninas de Imperatriz, Açailândia e Lago da Pedra. Dos 94 municípios do país mais vulneráveis ao tráfico de pessoas, cinco estão no Maranhão. Recentemente, a Semu atuou no recâmbio de uma jovem maranhense, vítima do tráfico de pessoas. A garota foi abandonada no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, depois que o traficante percebeu que ela tinha uma pequena deficiência física. Por essa ação, a Semu recebeu elogio formal da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República.

O Estado - Homens também são vítimas do tráfico?

Catharina Bacelar - O homem costuma ser vítima de trabalho escravo. São olheiros de futebol que levam crianças que depois desaparecem. No Japão, há relatos de comércio de pele humana tatuada para fazer abajur. São pessoas que se declaram doadores antes de morrer e, de repente, aparecem mortas. Tomei conhecimento desse fato em um seminário internacional ocorrido em Pernambuco.

O Estado - Novelas colaboram no combate a esse crime?

Catharina Bacelar - Colaboram bastante. Antes de levar a novela Salve Jorge ao ar, a TV Globo procurou órgãos e instituições especializados para saber se havia o preparo necessário para receber as denúncias que poderiam surgir.

O Estado - Quais ações a Semu executa para acabar com esse comércio ilegal?

Catharina Bacelar - Buscamos a instalação de um núcleo estadual de enfrentamento ao tráfico de pessoas, em parceria com a Secretaria de Estado de Direitos Humanos. O núcleo funciona em rede por todo o Brasil e tem ligações com o exterior. Nas proximidades, Maranhão, Piauí e Tocantins são os únicos estados que ainda não têm esse núcleo. Como parte da programação dos 16 Dias de Ativismo, no dia 17 de dezembro, haverá solenidade para instalação desse núcleo, que envolve diversos órgãos, como Capitania dos Portos, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal. Haverá estrutura com viaturas, computadores, pessoal.

O recurso utilizado provém do Governo Federal, com contrapartida estadual. A Semu não pode trabalhar de forma isolada no combate ao tráfico de mulheres. É crime organizado, é muito sério. Já me envolvi pessoalmente em algumas situações. Hoje recebo ligações da Polícia Federal do Pará com informações. Nesse núcleo, exerceremos nosso papel promovendo ações afirmativas. Vamos discutir a temática, produzir oficinas para que as jovens percebam as características desses crimes, para que elas percebam que esses convites não são promessas de um futuro melhor.

O Estado - Em duas semanas, dois episódios de violência doméstica chamaram a atenção. Duas mulheres foram assassinadas pelos seus companheiros no Maranhão. Em relação às outras unidades da federação, o estado ocupa uma posição muito ruim?

Catharina Bacelar - O Maranhão figura entre os estados onde menos ocorre esse tipo de violência. A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência Contra a Mulher está visitando os estados brasileiros, mas deixou o Maranhão bem para o final, por não figurar entre aqueles onde mais ocorre esse tipo de assassinato. Aqui no Maranhão há uma característica interessante. Não há um grande volume de casos, mas são crimes que chocam pela brutalidade. Em alguns casos, a coisa se dá com requintes de crueldade. Muitas mulheres são degoladas, decapitadas, esquartejadas, o que não é tão comum nas outras regiões. Na maioria das vezes, essas mortes ocorrem no campo. A maioria dos agressores é lavrador. Eles utilizam o próprio instrumento de trabalho, que é o facão, para assassinar as próprias mulheres.

O Estado - Como essa situação tem sido combatida?

Catharina Bacelar - Já visitamos 143 municípios. Depois da campanha, retomaremos as viagens pelas cidades. Temos uma unidade móvel que está neste momento fazendo ações, levando informações para as mulheres no interior do estado.

O Estado - As medidas protetoras, como a Lei Maria da Penha, que combate a violência contra a mulher, não têm se mostrado eficientes? Há alguma falha?

Catharina Bacelar - Até certo ponto, a Lei Maria da Penha tem sido muito eficiente. Mas como pode o Estado garantir que o agressor não vá efetivamente se aproximar da mulher, se aproximar da família e chegar e cometer algum crime? Em Minas Gerais, essa tornozeleira que também está sendo usada no Maranhão para vigiar criminosos é usada contra agressores de mulheres. Há um dispositivo, como um pingente, que vibra, avisando à mulher quando esse homem já ultrapassa a distância designada pelo juiz. São medidas que podem ser utilizadas.

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